quinta-feira, 27 de março de 2008

Embondeiro, o senhor da múcua




Nos meus tempos de puto radical em Luanda, a expressão "cara de múcua" queria dizer "estar chateado", "estar triste", quando muito "cara de parvo". Tás com cara de múcua. Era uma expressão ... inexpressiva. Servia para tudo o que quisesse dizer tristeza, negatividade.


Nunca me preocupei com isso, com a expressão. Naquele tempo recuado dos anos 50, Luanda era uma cidade pacata a espreguiçar-se devagarinho para cima da terra encarnada da parte alta. Lá em baixo ficava a baía, a ilha, e todas as fantasias dos miúdos daquele tempo. Éramos almirantes de grandes batalhas navais em combates ferozes contra os carapaus de gato ou contra as mabangas meio anestesiadas da poluição dos barcos. Tudo era muito simples, muito natural, até mesmo a paciência de mestre Alcino que insistia em nos incutir as técnicas de bem chinjicar os dongos da pesca e as redes do ganha-pão.


Mas tudo isso eram parentesis na minha adoração - não era admiração não - era mesmo adoração do grande embondeiro existente à beira da estrada de Catete, a estrela polar dos miúdos daquela Vila Alice nascente. Ali nos reuniamos para as grandes conquistas, ali descansávamos das grandes aventuras, ali trepávamos para prescrutar novos horizontes. Dali retirávamos as múcuas pesadas e gordas, que tinhamos de atirar para o chão para vencermos a resistência da casca e termos acesso à farinhenta fruta interior.
Na memória das papilas ainda reside aquele gosto acre que parecia fazer crescer cabelos nos dentes.


O embondeiro, imbondeiro, ou o que lhe chamem, é o elefante africano que não sai do lugar por entender que ali é que presta serviço na sua passividade de se deixar trepar e de ofertar os seus frutos. E, nisso, é mãe de colo aberto a todos os filhos.


Passados tantos anos, não esqueço aquele imbondeiro, está-me retido na retina, é o padrão do descobrimento da minha infância africana.

Un lugar en el mundo




Cuando la vida es enemiga a causa de la insensatez de los que sólo albergan odio y muerte, en algún lugar del mundo los hombres de buena voluntad, los que son capaces de detenerse para saludar al amor y abrazarse, ponen el peso en la balanza para equilibrar lo que intenta desvivirnos.
En esta ciudad que se levanta fresca y joven sobre un río generoso , "árabes y judíos tendrán una escultura que celebre su buena relación a través de los años en la ciudad de Rosario (-)La obra se realizará en bronce que se obtendrá en su mayoría de la donación de llaves( de esta manera todos podremos contribuir) y conforma una testimonia de la buena relación entre ambas comunidades. La esquina elegida constituye el epicentro de la actividad comercial que generan tantos judíos como árabes en la calle San Luis de Rosario.Allí , han sabido convivir año tras año.
(-) Esta escultura será un homenaje a las buenas relaciones entre ambos pueblos en Rosario"( extraído de Rosario,Noticias )
Como en el realismo mágico de las obras de García Márquez, esto sucede en la Argentina. Por eso amo mi país donde , a pesar de que se nos señale de desordenados, irrespetuosos de la ley, con un aire de tango al andar, corruptos en política, impuntuales , una voz en la calle nos hace dar vuelta para caer en los brazos de un amigo que sonríe feliz al encontrarnos.
Este realismo mágico hoy levanta una estatua en pleno centro para homenajear a los hijos de dos pueblos , que a pesar de la historia no pueden odiarse, porque aquí, aquí, sólo tienen cabida para la amistad.
Y así,mientras árabes y judíos eternizan su abrazo en bronce, el mar insomne lame con tristeza la arena de un medio oriente con sabor a lágrimas.
marita faini Adonnino-Argentina

segunda-feira, 24 de março de 2008

Perguntas à Língua Portuguesa

Mia Couto


Venho brincar aqui no Português, a língua. Não aquela que outros embandeiram. Mas a língua nossa, essa que dá gosto a gente namorar e que nos faz a nós, moçambicanos, ficarmos mais Moçambique. Que outros pretendam cavalgar o assunto para fins de cadeira e poleiro pouco me acarreta.
A língua que eu quero é essa que perde função e se torna carícia. O que me apronta é o simples gosto da palavra, o mesmo que a asa sente aquando o voo. Meu desejo é desalisar a linguagem, colocando nela as quantas dimensões da Vida. E quantas são? Se a Vida tem é idimensões?
Assim, embarco nesse gozo de ver como escrita e o mundo mutuamente se desobedecem. Meu anjo-da-guarda, felizmente, nunca me guardou.
Uns nos acalentam: que nós estamos a sustentar maiores territórios da lusofonia. Nós estamos simplesmente ocupados a sermos. Outros nos acusam: nós estamos a desgastar a língua. Nos falta domínio, carecemos de técnica. Ora qual é a nossa elegância? Nenhuma, excepto a de irmos ajeitando o pé a um novo chão. Ou estaremos convidando o chão ao molde do pé? Questões que dariam para muita conferência, papelosas comunicações. Mas nós, aqui na mais meridional esquina do Sul, estamos exercendo é a ciência de sobreviver. Nós estamos deitando molho sobre pouca farinha a ver se o milagre dos pães se repete na periferia do mundo, neste sulbúrbio.
No enquanto, defendemos o direito de não saber, o gosto de saborear ignorâncias. Entretanto, vamos criando uma língua apta para o futuro, veloz como a palmeira, que dança todas as brisas sem deslocar seu chão. Língua artesanal, plástica, fugidia a gramáticas.
Esta obra de reinvenção não é operação exclusiva dos escritores e linguistas. Recriamos a língua na medida em que somos capazes de produzir um pensamento novo, um pensamento nosso. O idioma, afinal, o que é senão o ovo das galinhas de ouro?
Estamos, sim, amando o indomesticável, aderindo ao invisível, procurando os outros tempos deste tempo. Precisamos, sim, de senso incomum. Pois, das leis da língua, alguém sabe as certezas delas?
Ponho as minhas irreticências. Veja-se, num sumário exemplo, perguntas que se podem colocar à língua:
• Se pode dizer de um careca que tenha couro cabeludo?
• No caso de alguém dormir com homem de raça branca é então que se aplica a expressão: passar a noite em branco?
• A diferença entre um ás no volante ou um asno volante é apenas de ordem fonética?
• O mato desconhecido é que é o anonimato?
• O pequeno viaduto é um abreviaduto?
• Como é que o mecânico faz amor? Mecanicamente.
• Quem vive numa encruzilhada é um encruzilhéu?
• Se diz do brado de bicho que não dispõe de vértebras: o invertebrado?
• Tristeza do boi vem de ele não se lembrar que bicho foi na última reencarnação. Pois se ele, em anterior vida, beneficiou de chifre o que está ocorrendo não é uma reencornação?
• O elefante que nunca viu mar, sempre vivendo no rio: devia ter marfim ou riofim?
• Onde se esgotou a água se deve dizer: "aquabou"?
• Não tendo sucedido em Maio mas em Março o que ele teve foi um desmaio ou um desmarço?
• Quando a paisagem é de admirar constrói-se um admiradouro?
• Mulher desdentada pode usar fio dental?
• A cascavel a quem saiu a casca fica só uma vel?
• As reservas de dinheiro são sempre finas. Será daí que vem o nome: "finanças"?
• Um tufão pequeno: um tufinho?
• O cavalo duplamente linchado é aquele que relincha?
• Em águas doces alguém se pode salpicar?
• Adulto pratica adultério. E um menor: será que pratica minoritério?
• Um viciado no jogo de bilhar pode contrair bilharziose?
• Um gordo, tipo barril, é um barrilgudo?
• Borboleta que insiste em ser ninfa: é ela a tal ninfomaníaca?
Brincadeiras, brincriações. E é coisa que não se termina. Lembro a camponesa da Zambézia. Eu falo português corta-mato, dizia. Sim, isso que ela fazia é, afinal, trabalho de todos nós. Colocámos essoutro português - o nosso português - na travessia dos matos, fizemos com que ele se descalçasse pelos atalhos da savana.
Nesse caminho lhe fomos somando colorações. Devolvemos cores que dela haviam sido desbotadas - o racionalismo trabalha que nem lixívia. Urge ainda adicionar-lhe músicas e enfeites, somar-lhe o volume da superstição e a graça da dança. É urgente recuperar brilhos antigos.
Devolver a estrela ao planeta dormente.

sexta-feira, 21 de março de 2008

quarta-feira, 19 de março de 2008

HOT CLUBE DE PORTUGAL


Faz hoje sessenta anos que um digníssimo representante da espécie humana fundou um clube peculiar. A minha homenagem ao Luiz Villas-Boas que nos anos quarenta começou como tradutor de artigos e livros de jazz, passando a divulgá-lo pela rádio (o primeiro programa de jazz foi dele), pela televisão e através de festivais. Onde estiver que tenha os sentidos cheios de música que tanto adorava. Da minha parte um muito obrigado.

sexta-feira, 14 de março de 2008

Brasil, Brazil


Finalmente Portugal assinou o Acordo Ortográfico durante a visita do nosso Presidente da República ao Brasil por ocasião dos 200 anos da chegada da corte portuguesa ao Rio de Janeiro. Depois de muitas resistências, Portugal vai ter de aproximar a sua forma de escrever da forma brasileira - vamos deixar cair os c e os p mudos, isto é, aqueles que não serviam para nada em "activo" ou em "baptizado". Para quem trabalha com a escrita como eu, acho que vai ser necessária uma fase de adaptação à nova ortografia, aliás já prevista para só entrar em real funcionamento daqui a uns anos.
Por mim, fico de bem com as mudanças até porque, se tiver dúvidas (e quem as não terá?) há sempre forma de recorrer a um bom corrector ortográfico. Mas não posso deixar de reflectir sobre este fenómeno maravilhoso que são as línguas escritas e faladas, especialmente no que respeita ao português nas suas variadas vertentes - brasileiro, angolano, moçambicano, caboverdeano, etc. O português falado com outra pronúncia que não a de Lisboa já eu falava em Angola faz tempo. E o português escrito como se falava em Angola já eu li muito graças às obras do Luandino Vieira, meu velho companheiro de outras andanças. Mais tarde, por via profissional e de amizades de colegas brasileiros fui ao Brasil várias vezes, colaborei pontualmente com a Rádio Bandeirantes na fórmula, e fui correspondente na Europa da revista electrónica MotorCar do meu amigo Silvio Porto. Nessas caminhadas, fiz novos amigos em Minas Gerais, no Rio e em S.Paulo. Agora, neste interessante universo dos blogues, tenho vindo a fazer novas amizades como a mais recente de Lumma no seu Conta Gotas. Enriqueci o meu conhecimento do Brasil e dos brasileiros através da leitura de vários autores brasileiros para além dos amigos. Julgo ter ganho alguma experiência em relação ao país e ao povo . Não alinho, portanto, no estereótipo frequentemente usado aqui em Portugal segundo o qual os brasileiros só gostam de samba, futebol, praia e carnaval. Pura ignorância para não lhe chamar pura demagogia.
Para não me alongar mais, direi simplesmente que acho muito útil para nós a imigração brasileira que nos ensinou a sermos mais afáveis nos lugares públicos (restaurantes, atendimentos ao público) nos deu novos horizontes no campo da publicidade, do marketing, da arte da paginação e nos despertou para a realidade que é o grande Brasil como mercado turístico e de negócios. "Eles" diz-se, ainda estão na gama dos países ditos do terceiro Mundo mas, em muitíssimos aspectos, "eles" estão a léguas de nós.
Nunca tive complexos em dizer que a lingua portuguesa se mantém viva e evolutiva graças ao Brasil. Por alguma razão, quem aprende português, o acha mais fácil na vertente brasileira do que na portuguesa. Seria bom que nos descomplexássemos de vez em relação ao Brasil e ao português brasileiro e deixássemos de ter a mania de que nós é que falamos o português correcto (ou será correto?).
Venha daí o acordo, por muito que seja polémico ... ou...polêmico?

terça-feira, 11 de março de 2008

O meridiano


Corta a terra ao meio, divide-a em duas metades como uma laranja pronta a ser espremida.
Mas, o meridiano, este aqui que eu não deixei escapar entre Zaragoça e Lérida, o de Greenwich, com os seus 180 graus do lado de cá e os outros 180 graus do lado do anti meridiano, tem muito que se lhe diga. Por causa dele temos de mexer nos relógios e mudar horas, por causa dele temos de fazer loucas contas de cabeça para sabermos que horas são em Timor e, se tivermos de explicar isto a uma criança - olha querida lá já estão em amanhã - a coisa complica-se.
É sempre bom passar o meridiano, este e todos os outros. Sou, aliás, de opinião que deviamos ter mais meridianos à mão de semear para os podermos passar sempre que nos apetecesse. Os 24 existentes graças aos senhores que andam a estudar estas coisas desde há séculos podiam subdividir-se em outros tantos, aliás, até se dividem, é só querermos imaginá-los em grupos de sessenta nos intervalos dos grandes. Assim, seguramente arranjaria um meridiano da Lourinhã que bem merece e até lhe ficava bem uma placa à entrada - Lourinhã, terra dos dinossauros, da loba, da aguardente da Lourinhã e do meridiano - e os papalvos como eu parariam o carro e fariam fotos souvenir para mostrarem lá em casa e dizerem às criancinhas - olha querida, quando fizemos esta foto (souvenir) estavas tu a sair da escola; mas eu estava com vocês no carro!!!; sim, mas isto é só para fazer de conta!; ahhhhh!!!!

domingo, 9 de março de 2008

O que aconteceu?


Era um dia daqueles em que apetece fazer uma reconciliação com o que nos aborrece e uma aliança com o que nos agrada. Passava um sol tranquilo, a terra cheirava a fresco, o vento tinha retirado seus sopros dali e nem o ruído da estrada perto podia perturbar a quietude do lugar.
Mas aquele pequeno lago de dar água a beber aos animais parecia fazer parte de outra paisagem individualizada pela presença daquela vaca. Era como serigrafia de artista conceituado que, para torná-la pessoal e única, introduziu um elemento distintivo - a vaca.
A chamada à contemplação derivada do ambiente até ali experimentado derrubava-se brutalmente sobre a paz de espírito. O animal, meio enterrado na lama, somente movia a cabeça e essa, mesmo assim, muito devagar, como que em slow motion.
Estaria aquele ser simplesmente a usufruir de um pequeno luxo ou, pelo contrário, estaria em sofrimento e sem ninguém para o acudir? A tempo?
Nunca saberei. Inquietei-me ao ter sido trespassado por tal pensamento mas logo entrou em funcionamento o mecanismo de auto-defesa com um olhar automático para o relógio e a decisão precipitada de continuar caminho pela estrada fora.
Não tinha capacidade de intervenção, é verdade, existia uma vedação. Acho que fabriquei rapidamente vários alibis para virar as costas àquele lugar subitamente maldito.
Mas não me libertarei dele enquanto tiver esta foto no meu arquivo.

Um ano


Faz um ano que estive assim, de peito aberto ao meio.

Hoje já nem cicatriz tenho para mostrar, nem isso interessa.

O que interessa é que festejo este dia de hoje como o primeiro aniversário de nova vida porque, inevitavelente, não escapo ao ponto zero que demarca o antes e o depois do incidente.

Quando "isto" acontece, sofre-se um abanão grande e repõe-se muita coisa na balança do deve e do haver. Mas convém não interiorizar demasiado e passar à frente entrando tão depressa quanto possível no ritmo normal.

Tudo acaba em bem quando a única sequela que nos fica é a de nos darmos conta da nossa fragilidade e da efeméride que somos.


Com a foto espero não chocar a sensibilidade de algumas pessoas.

sábado, 8 de março de 2008

TODOS POR LA PAZ

Ayer se llevó a cabo la reunión cumbre de presidentes de latino américa en la capital dominicana.
Fueron siete horas de debate en las que fue un placer oírlos y un pecado perder alguno de sus detalles.Sin duda esta reunión cumbre pasará a los anales de la historia latinoamericana.
La buena voluntad de los magistrados, a pesar de las duras palabras cruzadas, fueron la herramienta para allanar el camino para una vida en paz y buena vecindad entre las naciones.
Sin acartonamiento, sin trajes de etiqueta, aquello era una reunión entre viejos conocidos, sin perder por ello la seriedad del caso.
En el cielo de la política sudamericana,comienza a destellar una nueva luz y es el joven presidente de Ecuador, Rafael Correa.Claro, preciso, directo, sin manejar ambigüedades,ni frases doctorales en sólo nueve minutos expresó sus intenciones sin dejar dudas.
El canciller por Brasil, utilizó su larga carrera dentro de la diplomacia, para poner un bálsamo de tranquilidad y exhortar que , a pesar de las diferencias existentes, se busque inexorablemente un camino hacia la paz.
La presidenta argentina insistió sobre que nunca jamás se utilice la unilateralidad y convino,juntamente con sus pares, que el tema a tratarse en esa cumbre estaba relativizando lo urgente de latinoamérica que es el hambre,la pobreza y la explotación.
La usual verborragia de Hugo Chávez fue eclipsada por la justeza y precisión de Correa, pero aquél salpicó su discurso con notas simpáticas y hasta llegó a entonar los versos de una canción popular centroamericana, sin por ello perder seriedad lo que exponía. Y logra el permiso para que la madre de Betancourt ingrese al recinto.
Ante la incursión de tropas colombianas en territorio ecuatoriano, finalmente todos coinciden en una promesa unitiva , en que nunca jamás ninguna nación latinoamericana incurrirá en suelo hermano.
Finalmente, Leonel Fernández, el presidente dominicano,incita amigablemente a darse la mano a los presidentes enfrentados.A lo que el presidente de Honduras expresa una bella frase. "Hoy, Santo Domingo, se ha convertido en la capital de la paz latinoamericana."

marita faini adonnino-Argentina

EL HOMBRE Y LA MUJER


Hoy, 8 de marzo, es el día internacional de la mujer. ¿Y nosotros?-dirán los hombres.
Ah!, no sé.Será en reivindicazión de tanta mujer olvidada por siglos.Pero ésto hoy no lo tocaremos.
Envío el pensamiento poético de Víctor Hugo sobre la mujer en homenaje a todas las mujeres, a las independizadas, a las libres, a las esclavas, a las que sufren, a las que esperan, a las que son felices..
Una bella página, en la que el hombre no es olvidado.

EL HOMBRE Y LA MUJER (1802-1885)

El hombre es la más elevada de las criaturas;la mujer es el más sublime de los ideales.
El hombre es el águila que vuela;la mujer, el ruiseñor que canta.
Volar es dominar el espacio.
Cantar es conquistar el alma.

El hombre es el cerebro; la mujer es el corazón.
El cerebro fabrica luz; el corazón produce amor.
La luz fecunda.
El amor resucita.

El hombre es genio; la mujer es ángel.
El genio es inmensurable, el ángel es indefinible.
Se contempla lo infinito.
Se admira lo inefable.

La aspiración del hombre es la suprema gloria; la aspiración de la mujer, la virtud extrema.
La gloria hace lo grande.
La virtud, lo divino.

El hombre tiene la supremacía; la mujer, la preferencia.
La supremacía significa la fuerza.
La preferencia representa el derecho.

El hombre es fuerte por la razón; la mujer es invencible por las lágrimas.
La razón convence.
Las lágrimas conmueven.

El hombre es capaz de todos los heroísmos; la mujer de todos los martirios.
El heroísmo ennoblece.
El martirio sublimiza.

El hombre tiene un fanal: la conciencia; la mujer tiene una estrella: la esperanza.
El fanal guía.
La esperanza salva.

En fin, el hombre está colocado donde termina la tierra.
La mujer, donde comienza el cielo.

El hombre pienza; la mujer sueña.
Pensar es tener en el cráneo una larva.
Soñar es tener en la frente una aureola.

El hombre es el océano; la mujer es el lago.
El océano tiene la perla que lo adorna.
El lago, la poesía que deslumbra.

(puesto por Marita Faini Adonnino-Argentina)

terça-feira, 4 de março de 2008

Que tempo é o nosso?

Que tempo é o nosso? Há quem diga que é um tempo a que falta amor. Convenhamos que é, pelo menos, um tempo em que tudo o que era nobre foi degradado, convertido em mercadoria. A obsessão do lucro foi transformando o homem num objecto com preço marcado. Estrangeiro a si próprio, surdo ao apelo do sangue, asfixiando a alma por todos os meios ao seu alcance, o que vem à tona é o mais abominável dos simulacros. Toda a arte moderna nos dá conta dessa catástrofe: o desencontro do homem com o homem. A sua grandeza reside nessa denúncia; a sua dignidade, em não pactuar com a mentira; a sua coragem, em arrancar máscaras e máscaras.

Eugénio de Andrade in "Os afluentes do Silêncio"



segunda-feira, 3 de março de 2008

Direito à indignação

OPINIÃO
Publicado 29 Fevereiro 2008

Baptista Bastos
O ranço salazarista


Cada vez mais nos afastamos uns dos outros. Trespassamo-nos sem nos ver. Caminhamos nas ruas com a apática indiferença de sequer sabermos quem somos. Nem interessados estamos em o saber. Os dias deixaram de ser a aventura do imprevisto e a magia do improviso para se transformarem na amarga rotina do viver português e do existir em Portugal.
Deixámos cair a cultura da revolta. Não falamos de nós. Enredamo-nos na futilidade das coisas inúteis, como se fossem o atordoamento ou o sedativo das nossas dores. E as nossas dores não são, apenas, d’alma: são, também, dores físicas.
Lemos os jornais e não acreditamos. Lemos, é como quem diz – os que lêem. As televisões são a vergonha do pensamento. Os comentadores tocam pela mesma pauta e sopram a mesma música. Há longos anos que a análise dos nossos problemas está entregue a pessoas que não suscitam inquietação em quem os ouve. Uma anestesia geral parece ter sido adicionada ao corpo da nação.
Um amigo meu, professor em Lille, envia-me um email. Há muitos anos, deixou Portugal. Esteve, agora, por aqui. Lança-me um apelo veemente e dorido: “Que se passa com a nossa terra? Parece um país morto. A garra portuguesa foi aparada ou cortada por uma clique, espalhada por todos os sectores da vida nacional e que de tudo tomou conta. Indignem-se em massa, como dizia o Soares.”
Nunca é de mais repetir o drama que se abateu sobre a maioria. Enquanto dois milhões de miúdos vivem na miséria, os bancos obtiveram lucros de 7,9 milhões por dia. Há qualquer coisa de podre e de inquietantemente injusto nestes números. Dir-se-á que não há relação de causa e efeito. Há, claro que há. Qualquer economista sério encontrará associações entre os abismos da pobreza e da fome e os cumes ostensivos das riquezas adquiridas muitas vezes não se sabe como.
Prepara-se (preparam os “socialistas modernos” de Sócrates) a privatização de quase tudo, especialmente da saúde, o mais rendível. E o primeiro-ministro, naquela despudorada “entrevista” à SIC, declama que está a defender o SNS! O desemprego atinge picos elevadíssimos. Sócrates diz exactamente o contrário. A mentira constitui, hoje, um desporto particularmente requintado. É impossível ver qualquer membro deste Governo sem ser assaltado por uma repugnância visceral. O carácter desta gente é inexistente. Nenhum deles vai aos jornais, às Televisões e às Rádios falar verdade, contar a evidência. E a evidência é a fome, a miséria, a tristeza do nosso amargo viver; os nossos velhos a morrer nos jardins, com reformas de não chegam para comer quanto mais para adquirir remédios; os nossos jovens a tentar a sorte no estrangeiro, ou a desafiar a morte nas drogas; a iliteracia, a ignorância, o túnel negro sem fim.
Diz-se que, nas próximas eleições, este agrupamento voltará a ganhar. Diz-se que a alternativa é pior. Diz-se que estamos desgraçados. Diz um general que recebe pressões constantes para encabeçar um movimento de indignação. Diz-se que, um dia destes, rebenta uma explosão social com imprevisíveis consequências. Diz a SEDES, com alguns anos de atraso, como, aliás, é seu timbre, que a crise é muito má. Diz-se, diz-se.
Bem gostaríamos de saber o que dizem Mário Soares, António Arnaut, Manuel Alegre, Ana Gomes, Ferro Rodrigues (não sei quem mais, porque socialistas, socialistas, poucos há) acerca deste descalabro. Não é só dizer: é fazer, é agir. O facto, meramente circunstancial, de este PS ter conquistado a maioria absoluta não legitima as atrocidades governamentais, que sobem em escalada. O paliativo da substituição do sinistro Correia de Campos pela dr.ª Ana Jorge não passa de isso mesmo: paliativo. Apenas para toldar os olhos de quem ainda deseja ver, porque há outros que não vêem porque não querem.
A aceitação acrítica das decisões governamentais está coligada com a cumplicidade. Quando Vieira da Silva expõe um ar compungido, perante os relatórios internacionais sobre a miséria portuguesa, alguém lhe devia dizer para ter vergonha. Não se resolve este magno problema com a distribuição de umas migalhas, que possuem sempre o aspecto da caridadezinha fascista. Um socialista a sério jamais procedia daquele modo. E há soluções adequadas. O acréscimo do desemprego está na base deste atroz retrocesso.
Vivemos num país que já nada tem a ver com o País de Abril. Aliás, penso, seriamente, que pouco tem a ver com a democracia. O quero, posso e mando de José Sócrates, o estilo hirto e autoritário, moldado em Cavaco, significa que nem tudo foi extirpado do que de pior existe nos políticos portugueses. Há um ranço salazarista nesta gente. E, com a passagem dos dias, cada vez mais se me acentua a ideia de que a saída só reside na cultura da revolta.
APOSTILA – Rui Santos, comentador da SIC, na área do futebol, foi alvo de tentativa de agressão, no parque de estacionamento daquela estação televisiva. Quatro meliantes encapuçados (um, no interior de um automóvel; os outros, de trancas nas mãos) cercaram o jornalista, que lá se defendeu conforme pôde. É um incidente de tal gravidade que as autoridades terão de agir com a rapidez determinada pela própria natureza do crime. Porque de crime se trata. Não é, apenas, Rui Santos que está em jogo. É a própria liberdade de expressão que foi (e está, sei muito bem do que falo) ameaçada. Um abraço solidário para Rui Santos.
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Batista Bastos é considerado um dos maiores prosadores portugueses, para além de jornalista galardoado com numerosos prémios.

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