sábado, 21 de março de 2009

Mensagem II

Porta de entrada da igreja da Muxima

Deve ser da presença do Papa em Luanda. A força e o entusiasmo do povo angolano manifestados durante a visita do Santo Padre impressionam-me. São aos milhares e milhares, pelas ruas dos percursos de Bento XVI, a manifestarem a sua alegria e o seu agradecimento pela visita. Mas impressiona-me também a capacidade de organização dos angolanos. As pessoas estão vestidas de branco, usam bonés com a efigie do Papa, escuteiros aos milhares vindos de todo o país, mulheres de todas as províncias, como que a quererem dizer que Angola agradece, na pessoa do apóstolo, a paz que está a viver. Este povo é sofrido de 27 anos de cruel guerra fratricida, mais outros 14 contra o exército português.

Noto nos angolanos um receio quase físico de perderem esta paz com pequenos sete anos de idade. Aproveitam todas as ocasiões para agradecer.

Por mim, que não fui tocado pela fé, impressiono-me com estas manifestações verdadeiramente naturais, espontâneas. Assim como me impressionou ver aquelas duas crianças da foto, fazerem, de joelhos, todo o percurso desde a porta da igreja até ao altar, tal como vêm os adultos fazer.

Por mim, que não fui tocado pela fé, interrogo-me o que me levou outra vez àquela igreja onde me sento e me sinto bem no meio das pessoas que ali vão rezar e agradecer sei lá que concretização de pedidos. E, mais uma vez, admiro a generosidade e a simplicidade delas. Que força as move???

sábado, 7 de março de 2009

Mensagem

É mais forte que eu. Tenho de falar de mim. Mas vou ver se consigo passar uma mensagem. Não tenho muito jeito para pregador (senão seria bispo numa dessas igrejas onde se ganha muito dinheiro), mas acho-me no dever social de subir ao púlpito do blogosfera. A mensagem que quero mandar é de esperança e de crença em nós próprios. Alguns dos meus leitores muito rapidamente vão reagir - mensagem de esperança a valer só mesmo a da igreja, que é aquela que traz o selo de validade. Não aceito. Uma pessoa também pode passar mensagens de esperança. Tenho um exemplo na minha própria vida. Há muitos anos, vivi uma situação de dificulades económicas, com uma família para sustentar e insegurança quanto a trabalho. Em conversa de desabafo com um amigo (por acaso, ou talvez não), na mesma situação, ele deu-me uma grande lição de esperança e de crença nas suas capacidades como indivíduo: "não te desesperes, mantém-te sempre atento ao que te rodeia, há-de surgir-te a oportunidade que te vai tirar dessa situação".

Continuamos na conversa, a última porque nunca mais voltamos a ver-nos. Ele arranjou trabalho no Porto, numa rádio, eu fui admitido na RTP. Ambos não desitimos. Recordo com saudade esse amigo que me ajudou a não perder a esperança e me ensinou a continuar a lutar mesmo em condições adversas.

Não esperava, 30 anos depois, voltar a receber uma lição, uma mensagem e sentir necessidade de a partilhar.

Faz hoje dois anos que tive uma síncope, caí inconsciente, fiquei um tempo indeterminado como "morto". Se tivesse morrido naquela altura, não teria sofrido nada. Tinha ido acordar a minha neta Iara para se levantar para a escola, como fazia todos os dias. Ia descer a escada para ir preparar o pequeno almoço dela na cozinha. Caí fulminado antes da escada. Foi um milagre não ter caído aqueles degraus todos. Despertei na ambulância, confuso, sem perceber porque estava ali. Uma enfermeira foi-me fazendo testes pelo caminho: como me chamava, que idade tinha, onde morava, ao mesmo tempo que controlava um tubinho de soro "espetado" na veia. "Apaguei-me" à entrada no hospital de primeira fase - Torres Vedras . Recordo-me de, mais tarde, um médico me perguntar como me sentia e que se lembrava de mim, da televisão. Imaginam a minha alegria!!!!! Eu nem sabia muito bem quem eu era....

O processo de recuperação da "minha vida" estava iniciado, faltavam alguns exames mais, cateterismos, para ver o entupimento ou não das veias. Estava todo entupido e, o médico, simpático e positivo, até me disse (certamente para eu rir): oh Helder, não consigo passar por lado nenhum das suas veias, você nestas condições, pelas estatísticas, devia era estar morto....!!!! Achei simpática a ideia mas não aderi. Lembro-me de lhe responder: estou nas suas mãos, vocês sabe o que é preciso fazer.

O pós-operatório de uma operação de peito aberto é prolongado no tempo e confuso no espírito. Depois de nos serrarem o esterno e manipularem (isso mesmo, retirarem o nosso coração do seu lugar e virarem-no para verem melhor), depois de nos colocarem bypasses feitos daquela veia safena que temos nas pernas, passámos a ser outra pessoa. Algo de muito vital, muito profundo, muito nosso foi mexido.

É verdade que tinha de ser assim e é assim mesmo que deve ser. O meu médico sabia muito bem o que tinha de fazer naquelas 5 horas em que teve o meu EU nas mãos. E eu nunc duvidei de que sairia dali vivo. A convalescença deste tipo de intervenção altera a nossa maneira de viver, ou, melhor, a nossa maneira de ver a vida. Passamos a priorizar outros valores, passamos a ter uma visão mais abrangente da vida e, sobretudo, passamos a perceber que a vida tem, de facto, uma dimensão ... efémera. Estás muito bem a acordar a tua neta e, no segundo seguinte, cais "morto". É esta barreira tão frágil entre estar e deixar de estar, ser e deixar de ser, que passamos a valorizar e a respeitar.

Tenho alguns amigos que viveram experiência idêntica à minha, cada um tendo reagido de forma diferente do outro. Cada caso é um caso. Mas, a passagem pela linha de fronteira marca-nos para o resto das nossas vidas.
O essencial, na minha maneira de entender, é considerar que recebemos um crédito e que temo o dever de o usar da melhor maneira.
Em vez de nos lamentar-nos pelos que nos aconteceu, temos de agir como se nada tivesse acontecido. Mais que isso, temos de agir acima do nível em que actuamos antes.
O crédito tem uma validade desconhecida. Cumpre-nos usá-la como se fosse infinita.

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