domingo, 31 de dezembro de 2006

Coitado do TJ

O TJ, como ternamente baptizámos um cão que vadiava pelo "pátio dos malucos" da RTP no velho Lumiar, tinha as costas largas. Quando algo não corria bem com o Telejornal, a culpa era do TJ. Ou porque o filme da reportagem de última hora tardava na revelação, ou porque as dactilógrafas se atrasavam com os pivots, ou porque o telecinema não arrancava a tempo da deixa, a culpa era do TJ.
Fazer o Telejornal naqueles anos 70/80 era mais arriscado do que fazer o Lisboa-Dacar hoje. Durante o dia, até à hora de ir para o ar às 20, o TJ Telejornal tirava o fôlego a qualquer um, deixáva-nos de rastos. Ao irmos para o estúdio - primeiro o 3, mais tarde o 4 - com a colecção numa mão e o coração na outra, nunca sabíamos como "aquilo" ia acabar. Uma certeza tinhamos. Seríamos desancados, sem falha, no Diário de Lisboa do dia seguinte. Na redacção encarávamos tudo isso com alguma bonomia, talvez uma forma de descarregarmos a adrenalina acumulada. E, até encontrávamos momentos de humor como o que provocámos a propósito do conflito greco-turco por causa de Chipre.
Couto e Santos, na altura jornalista do sector internacional, senhor de uma imaginação sem limites, mais tarde médico, decidiu fabricar uma notícia sobre o assunto, "só para ver a reacção do Adriano Cerqueira".
Rezava assim o lead da notícia: " Devido ao conflito greco-turco por causa de Chipre, os gregos foram terminantemente proíbidos de tomarem banhos turcos." Depois, seguia-se o desenvolvimento da notícia "segundo as nossas fontes".
Quando o saudoso Adriano chegou à banca para verificar os textos, estávamos todos atentos ao que iria acontecer. E, quando o Adriano, avançando folha a folha na banca, chegou à do Chipre, rebentou a bronca aliás esperada por nós em ansiosa expectativa. "Quem foi que escreveu esta m.... do Chipre?", gritou o Adriano para uma redacção em silêncio. "Fomos nós", respondemos todos os do Internacional, mal contendo o riso. "Quem foi a vossa fonte", voltou o Adriano a perguntar. "Fomos nós", respondemos já descompostos pelo riso. "Seus filhos da p......, vocês não sabem que não se brinca com as notícias? Quero-vos todos no meu gabinete depois do Jornal". Claro que a notícia foi de imediato rasgada e furiosamente deitada para o caixote do lixo.
Reunidos em frente a um Adriano Cerqueira já mais calmo - o Jornal não correra mal - achámos por bem sossegar o chefe pedindo-lhe desculpa pela brincadeira. Bom coração, o Adriano para nós " Bom, vá lá, não me voltem a fazer uma brincadeira destas". Saímos fininho do gabinete em respeitoso silêncio, quando uma voz exclama mansinho: " a culpa foi do TJ". Acho que o Adriano ouviu. Mas já estávamos todos a caminho do Biafra para o jantar.

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