quarta-feira, 19 de dezembro de 2007

Feliz Natal? Talvez sim, talvez não.







Há crianças que ainda acreditam no Pai Natal, no Menino Jesus no presépio e participam entusiastas na montagem da árvore de Natal, profusamente ornamentada com tralha comprada no chinês mais próximo. E não deixam de mandar cartinhas a meter cunhas ao Pai Natal para receberem Play Stations, telemóveis e Nintendos e Barbies e outros artigos de gande consumo anunciados até à exaustão nas televisões e nos canais ditos infantis. É escandalosa a lavagem ao cérebro feita às crianças nos canais ditos infantis. Para as crianças de hoje o Natal não passa de uma fase excepcional para elas esvaziarem o 13º mês dos pais, avós e outros familiares. Estou em crer que a tradição de deixar o sapatinho para as prendas caiu em total desuso. Suspeito que algumas, em vez de deixarem o sapatinho à beira da soleira da porta ou da chaminé, colocam diplomaticamente uma toalha sobre a mesa com a desculpa de que o Pai Natal é capaz de chegar cansado e querer comer qualquer coisa. É para fingir que acreditam e jogarem o jogo da publicidade. A mesa tem mais área útil do que o sapato.
Sabem bem que o Pai Natal, o das boas prendas, já não viaja num trenó puxado por renas. Chega de Audi ou Mercedes travestido de executivo. Aliás, dificilmente vejo as renas do Pai Natal aguentarem o calor de África (caso ele passasse por lá) donde deduzo que o velho senhor não vai lá. A menos que tenha alguns adjuntos locais que atrelam umas pacaças à carroça, caso tenham conseguido domesticar algumas para tal tarefa. Mas nem os garotos de África acreditam. Talvez os que foram catequizados pela igreja, mas não a maioria do interior cujas tradições são completmente outras.

Sinceramente não vejo grande coisa de interessante no Natal daqui da Europa. Faz um frio de rachar, é capaz de chover até, neve só na Serra da Estrela e custa um balúrdio, toda a gente tem um Pai Natal a trepar pelas paredes das casas, as operadoras dos telemóveis oferecem todas montes de msn's e a bemdita GNR anuncia mais uma grande operação ... de Natal. E toda a gente anda excitadissima "a fazer compras". Não tem graças nenhuma.
O Natal tornou-se um dos maiores negócios do ano e só tem a ver com a tradição porque utiliza os tais Pais Natais trepadores de paredes e vende pinheiros nos super-mercados.
Isto está a ficar tudo muito normalizado, estandardizado, comercializado, negociado. Viram bem o frenesi das pessoas na Baixa a fazerem compras? Algumas não compram nada, só fingem, mas ficam bem nas estatísticas.
Em África era mais sossegado o Natal. Convinha. O calor impedia grandes correrias.
Mas era tranquilo e ... não havia lojas de chineses. Os pais faziam o velho bacalhau para a tradicional consoada, os miúdos acreditavam nos livros de histórias, punham o sapatinho para o Pai Natal deixar lá as prendas e, no dia 25 de manhã, first thing in the morning, iam a correr ao sapatinho para ver o que lá tinha caído. Normalmente, era pouca coisa, mas de um valor afectivo muito grande. Ah!, ainda havia a Missa do Galo, não sei se por cá se pratica, talvez, não sei. Acho que era assim que se chamava eu não dava muita importância a esse lado aliás não dava nenhuma, até porque já estava a dormir. Não havia televisão. Pessoalmente, eu gostava muito de ir na manhã do dia 25 ao jornal Diário de Luanda,que oferecia presentes às crianças. A todas as crianças.
Curiosamente o Natal em África sabia mais a Natal do que aqui na Europa. O dos brancos. Apesar do calor. O que fazia um pouco de confusão às crianças (todas) era a parte em que o Pai Natal aparecia vindo lá do Polo Norte com neve a pigar pelas renas abaixo. Não batia certo. Mesmo assim, acho que era mais saboreado no seu verdadeiro espírito ... natalício. Não irei ao ponto de dizer que por cá se perdeu o espírito natalício, muito boa gente ainda não o deixou escapar, especialmente os mais idosos.
Irrita-me um pouco é os espectáculos de Natal dos hospitais e não sei de quem mais que as televisões e as rádios nos impingem em boas doses de lamechice. São os maiores desfiles de lugares comuns que já ouvi em toda a minha vida. E, olhem que já é longa.
O exagêro do mercantilismo nesta quadra, para além de doentio e obnóxio retirou toda a beleza à história que, afinal, marca o nosso calendário e a época DC.
Confesso sem vergonha uma coisa: o Natal, para mim, o que tem de melhor mesmo é a reunião da família e os comes e bebes que se comem e se bebem na bemdita noite de Consoada. Acho que ninguém faz qualquer alusão ao significado dessa noite, suspeito até que poucos saberão do assunto, ou eu nunca dei por isso por causa da letargia que habitualmente me assalta lá para a uma da manhã, depois da bacalhauzada e do tintol.

Já agora, porque é que insistem em mostrar para onde é o Polo Norte? Acham que estou para lá ir apanhar frio à procura do velhote das barbas? Nem pensar!!













5 comentários:

Isabela Figueiredo disse...

Olha que eu vivi em Lourenço Marques até aos 13 anos e acreditava piamente no Pai Natal. Não chegavam muitas prendas nem muito caras, mas chegavam duas ou três. Imaginava que o Pai Natal era como um espírito bom, uma fada, porque sabia que ele não podia vir num trenó de pacaças.

Helder de Sousa disse...

Isabela,
a questão está mais no espírito de Natal, no conceito e menos na parte material das prendas embora estas fossem muito importantes para nós, miúdos em África.

kambuta disse...

Helder que crónica pertinente! Concordo contigo em absoluto. Um abraço.

Joao Coimbra disse...

Onde poderemos incluir este teu escrito? Em Contos de Natal para adultos ou em «estorias» do Natal em Africa? De qualquer forma brilhante!
So nao gosto e' desse teu apagar da «pilha» por volta da uma da manha... Este ano com «3 by-pass», e desde que o tintol seja de quakidade, tens de aguentar um prolongamento pelo menos ate as 3h da madrugada!
Festas Felizes

Helder de Sousa disse...

Kambuta e João, obrigado
Se o tintol for do bom (só pode)talvez me conceda um prolongamento caso os acompanhantes aguentem..
Boas Festas

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